Seja pelo o imbuído espírito natalício de paz e harmonia, seja pelo renovar de espectativas, este último muito associado à Passagem de Ano, à quebra com o passado, a oportunidade de de recomeçar. É por isto, pelo marco que representa, que tantas e tantas vezes, ano após ano fazemos ou tomamos por certas determinadas resoluções, na esperança de um futuro mais promissor, mais de acordo com as nossas expectativas e com as expectativas que cremos ou supomos que outros têm sobre nós.
A esperança é das melhores virtudes que temos na vida, pois sem esperança não há vida, arrisco. A esperança é como um fio condutor de vida. É um atributo necessário à vida, tanto pela manutenção de estados psicológicos positivos, como condition sine qua non para continuar, para viver e evoluir.
Todavia, não descarto a hipótese, que faria tanto ou mais sentido falarmos de perseverança, ao invés de esperança, pelo menos no sentido a que lhe atribuímos. Na maior parte das vezes, é muito importante termos esperança, porém será mais importante ainda, termos ou sermos, melhor dizendo, perseverantes face às circunstâncias.
Isto porque perseverança transmite ação, evoca a necessidade de trabalhar em prol de algo. Também assim, pode ser entendida a esperança. Porém, não tem o mesmo impacto. Esperança, traduz algo muito mais idílico, muito mais inalcançável.
Ora vejamos, quando ouço alguém dizer, algo do género, "tenho esperança que um dia vou conseguir o meu emprego de sonho”; tenho sempre a sensação, talvez errada, admito, que aquela pessoa está literalmente à espera que esse emprego de sonho ou sonho de emprego, lhe caia do céu.
Ao invés, alguém dizer, algo do género, "não vou desistir de conseguir o meu emprego de sonho”; revela a perseverança, mas também uma esperança viva, um locus de controlo interno, há ação, ainda que possa ser retórica.
É crucial termos esperança, sonhos até, mantém um determinado equilíbrio, permite-nos também, encarar dificultosas realidades com ânimo, mas é preciso estarmos cientes, que ter apenas esperança, é ter um locus de controlo externo, é depositar toda a responsabilidade nos outros e nas circunstâncias.
A esperança é também acreditar num futuro, e tal é fundamental para termos futuro. Mas uma atitude inerte, perante as nossas esperanças, dificilmente se transmutará a nosso favor. Falo claro, de esperanças, em que haja a possibilidade de locus de controlo interno, nestas incluo, talvez para espanto de muitos, por exemplo: "a esperança de um mundo melhor”; pois todos nós, temos a oportunidade de contribuir para um mundo melhor.
De facto, é nas pequenas coisas do nosso dia-a-dia, que podemos fazer a diferença, se todos tivéssemos uma atitude perseverante para um mundo melhor, e para tal, bastar-nos-ia algo tão simples como, termos uma conduta eximiamente justa, para com o próximo.
É viável que tenhamos outro tipo de esperança, que corrobora o meu pensamento, e nesse caso faz ainda mais sentido falar em esperança, pois o locus de controlo é totalmente externo, a título de exemplo: "a esperança de que haja vida em Marte”. Não temos qualquer controlo sobre a existência ou não de vida em Marte, nem está sequer ao nosso alcance, a menos que trabalhemos para uma Agência Espacial ou num Laboratório Especializado, para fazer prova de tal. Isto é ter simplesmente esperança.
Para a maioria, ter esperança é permanecer estático, é estar nas profundezas do Paraíso ou do Inferno. Na esperança que as circunstâncias sejam imutáveis, ou que mudem por si só, respetivamente.
Mas esperança deve ser mais do que isso, mais do que a “luz no final do túnel”, deve ser perseverança, no sentido de caminhar (trabalhar) em direção à "luz do final do túnel”.
Assim, não nos basta termos a esperança que o próximo ano seja um ano melhor, é necessário fazer o que está ao nosso alcance, para que seja efetivamente um ano melhor.
Herculano Andrade
Psicólogo Clínico, membro efetivo da OPP
Sociólogo
