Fogaça da Feira já é produto de origem protegida

A Comissão Europeia incluiu a Fogaça de Santa Maria da Feira na lista de produtos com denominação "Indicação Geográfica Protegida" (IGP). O pão doce é confecionado há mais de 500 anos na sequência de uma promessa feita ao Mártir S. Sebastião para que livrasse o concelho de Santa Maria da Feira do surto de peste que estava a matar a população.
Michael Turtle:
    Michael Turtle

A Fogaça da Feira, descrita como um "pão doce com aroma e sabor de limão e canela" tem a sua origem no século XVI, como pagamento de uma promessa na região de Santa Maria da Feira por causa de um surto de peste. O doce inspirado nas quatro torres do castelo feirense deu, ainda, origem à Festa das Fogaceiras que se realiza, anualmente, a 20 de janeiro, dia do feriado municipal. 

Diogo Almeida, do Agrupamento dos Produtores da Fogaça da Feira, que acompanhou todo o processo de certificação disse ao VerPortugal que a distinção do pão doce significa "antes de mais um reconhecimento de que o produto tem qualidade. Por outro lado salvaguarda a fogaça em futuras gerações de produtores uma vez que para comercializar o doce tem de ter fabrico em Santa Maria da Feira e a produção tem de ser feita com os ingredientes originais. Sem alterações. Em terceiro lugar, o fato da fogaça ser produto de denominação protegida garante ao consumidor que ao adquirir um exemplar vai consumir o verdadeiro doce de Santa Maria da Feira".

Em conversa com o VerPortugal, Diogo Almeida, refere ainda que "agora é que o trabalho vai começar uma vez que vai ser necessário separar 'o trigo do joio'. Ou seja, verificar quem não produz a fogaça como manda a receita e tentar aumentar o número de elementos do Agrupamento de Produtores bem dar um maior impulso à internacionalização do produto que já vai chegando, mediante algumas encomendas, a outros países".

Mas, então, qual a história da fogaça e da festa? Segundo a Confraria da Fogaça de Santa Maria da Feira, a "Festa das Fogaceiras" apareceu em 1505, altura em que o País foi fustigado por uma epidemia brava e cruel: a peste.

Nessa altura, os Condes do Castelo e da Feira, ramo nobre criado em 14 de janeiro de 1452, apelaram ao Mártir S. Sebastião para que acabasse com o morticínio dos feirenses, prometendo-lhes a realização de uma festa anual, onde o "voto" seria a "fogaça". Ou seja, anualmente, a festa decorria e na procissão um conjunto de crianças levaria à cabeça uma fogaça.

Até 1700 - data em que o Condado do Castelo e da Feira se extinguiu por falta de descendência, passando os seus domínios para a "Casa do Infantado" - a "Festa das Fogaceiras" foi promovida pelos senhores das Terras de Santa Maria da Feira, habitantes do paço intra-muros do Castelo. Daí, e durante quatro anos, a festa foi suspensa, reatando-se a tradição de seguida, e até 1749, por iniciativa das famílias mais abastadas do Concelho. Verificou-se entretanto novo surto de peste e em 1753, por Alvará de 30 de Julho, o Infante D. Pedro, irmão de D. João V, determinou à Câmara Municipal que assumisse definitivamente a realização da "Festa das Fogaceiras".

Esta determinação foi justificada com a vontade do povo e a existência "imemorial" do voto. Por isso, o voto foi cumprido pela Câmara Municipal até 1910, altura em que, invocando-se a separação entre a Igreja e o Estado, a festa passou a ser realizada por autoridades civis, a título indivídual, e pela Santa Casa da Misericórdia.

No dia 15 de Julho de 1939, a Câmara Municipal deliberou retomar a responsabilidade de realização da festa, decisão que se mantém agora como atribuição assumida pelo poder autárquico concelhio. As "fogaças do voto" foram inicialmente distribuídas pela população em geral, depois pelos pobres, mais tarde pelos presos e pelas personalidades concelhias, em fatias chamadas "mandados" e hoje entregues à autoridade religiosa, política e militar regional que tem jurisdição sobre o Município de Santa Maria da Feira.

Com a inclusão da fogaça somam-se já 1.349 os produtos alimentares protegidos na União Europeia, a que acrescem mais de 2.090 denominações registadas de vinhos, vinhos aromatizados e bebidas espirituosas.

Câmara congratula-se com certificação da fogaça

A Câmara Municipal de Santa Maria da Feira congratula-se pela inclusão – por parte da Comissão Europeia – da Fogaça da Feira na lista de produtos com denominação “Indicação Geográfica Protegida (IGP)”, etapa que vem culminar o longo processo de certificação deste pão doce secular, ícone da gastronomia de Santa Maria da Feira.

Para Emídio Sousa, presidente da Câmara Municipal de Santa Maria da Feira, "este é mais um marco histórico na afirmação do saber-fazer das gentes do território e na preservação e defesa dos produtos tradicionais locais”.

"A Fogaça da Feira é o ícone da nossa gastronomia e símbolo votivo da secular Festa das Fogaceiras. Tem uma história e um saber-fazer únicos, que é imperioso preservar, para além do impacto significativo que tem na economia local e no turismo da região Norte, que podemos e devemos potenciar, promovendo o produto e defendendo-o das imitações”, refere o autarca, que sempre acompanhou com grande interesse o processo de certificação, liderado pelo Agrupamento de Produtores de Fogaça da Feira, com o apoio da Confraria da Fogaça da Feira e da Câmara Municipal de Santa Maria da Feira.

A denominação Indicação Geográfica Protegida (IGP) é uma certificação oficial regulamentada pela União Europeia, atribuída a produtos gastronómicos ou agrícolas tradicionalmente produzidos numa região. Esta classificação vem determinar que a Fogaça da Feira passa a ser produzida exclusivamente dentro dos limites territoriais de Santa Maria da Feira e tem de respeitar as características, os ingredientes e o modo de confeção que a tornam única.

Saber-fazer local

A genuína Fogaça da Feira tem características específicas, que resultam da sua forte ligação à área geográfica, em particular ao saber-fazer local, no que se refere ao processo de preparação, bem como à mistura dos ingredientes e ao amassar, puxar a massa em rolo e espalmar em gravata, até ao enrolar do cone, que culmina com o corte que estiliza os quatro bicos que sugerem as quatro torres do Castelo de Santa Maria da Feira e que distinguem claramente a Fogaça de outros tipos de pão doce.

Formalizada a certificação da Fogaça da Feira por Bruxelas, Emídio Sousa reitera o apelo do Agrupamento de Produtores de Fogaça da Feira lançado a todos os produtores do concelho que não integram esta associação. “Procurem o Agrupamento, inteirem-se do processo de certificação e juntem-se a este movimento de defesa do tradicional pão doce de Santa Maria da Feira, pois todos sairão a ganhar”, reforça o edil feirense.

Com a publicação do Regulamento de Execução relativo à inscrição da denominação "Fogaça da Feira (IGP)” no registo das denominações de origem protegida e das indicações geográficas protegidas no Jornal Oficial da União Europeia a 14 de junho de 2016, o documento entra em vigor oficialmente 20 dias depois. Ou seja, a partir de 4 de julho, é oficial a denominação "Fogaça da Feira (IGP)”.

 

 


 

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