Depressão na Gravidez e Puerpério

A Gravidez é um estado psicofisiológico, em que, como de resto acontece em qualquer fase da vida de uma pessoa, podemos oscilar entre o “normal” e o patológico (fronteira ténue). No entanto, é inerente à gravidez e ao puerpério uma vulnerabilidade psicológica que potencia o risco psiquiátrico associado a esta fase do ciclo de vida da mulher. De facto, neste ciclo da vida, estão associadas uma série de transformações e a forma de as vivenciar ou como estas se desencadeiam são determinantes no desenvolvimento de depressões durante ou depois da gravidez.
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Tendo em conta uma visão biopsicossocial podemos considerar três grupos de fatores associados à depressão (do ponto de vista amplo): os socio ambientais (a pobreza, as redes de suporte formal e informal, o trabalho e o desemprego); os comportamentais (o tabagismo, o exercício físico, a dieta alimentar); os psicológicos (o tipo de personalidade, as capacidades de coping, o sistema de crenças relativas à saúde).

A potencialidade de ser mãe, inerente à mulher, associa-se à elevada probabilidade dessa condição lhe acarretar crises, conflitos e sentimentos contraditórios. O puerpério é uma das fases do ciclo desenvolvimental em que se carrega uma situação eminentemente crítica, pois constitui uma rutura do “status quo” psíquico, requerendo uma panóplia de respostas adaptativas.

A sociedade espera -desejabilidade social- que a mãe esteja feliz com o seu bebé. A mãe, por sua vez, muitas vezes não quer gorar as expectativas dos outros, mascarando os seus reais sentimentos quando, na realidade, a maternidade é vivida por muitas mulheres com mais sofrimento do que prazer. Mais, a mulher vê-se num novo papel que é o de ser mãe, e que tem de ser conjugado com todos os outros que desempenhava até então, a curto/médio prazo, terá de desempenhar os papéis na esfera privada e pública.

O puerpério ou período pós-parto é caracterizado pelo aparecimento de uma série de dificuldades, que acarretam um impacto negativo na perspetiva de autoeficácia da puérpera. Até ao presente, os especialistas não foram capazes de chegar a um consenso quanto às causas da depressão pós-parto. Muitos especialistas acham que esta é causada por diversos fatores que variam de pessoa para pessoa. Tem sido relacionada com causas de natureza bioquímica, psicológica, psiquiátrica, psicossocial e com aspetos sociodemográficos e de comorbilidade. Existem fatores que aumentam a probabilidade de ocorrência de depressão pós-parto, designadamente o stress, a falta de sono, a nutrição pobre, a falta de suporte social por parte do companheiro, família ou amigos, a história familiar de depressão, as complicações quer para a mãe, quer para o bebé, que advém do parto, a gravidez prematura, os problemas com a saúde do bebé, a separação entre a mãe e o bebé, o “bebé difícil” (temperamento, alimentação, sono, dificuldades em acalmá-lo) e pré-existência de neuroses ou psicoses.

As mães, frequentemente, experienciam diferentes graus de depressão durante as primeiras semanas após o parto. A gravidez e o parto são acompanhados por uma repentina alteração hormonal que afeta as emoções. Adicionalmente, a permanente responsabilidade que acarreta o nascimento de um bebé, representa uma necessidade de ajustamento psicológico e de estilo de vida, mesmo não sendo o primeiro filho. Estes stressores físicos e emocionais são frequentemente acompanhados por um inadequado descanso, que é prolongado até à estabilização das rotinas do bebé. Por isso, a fadiga e a depressão ocorrem não raras vezes.

Ainda não se conhecem com certeza os desencadeadores dos transtornos de humor no puerpério, contudo a comunidade científica tem vindo a identificar alguns fatores, especificamente, os fatores bioanímicos. A alteração de humor no puerpério ainda se relaciona com antecedentes psiquiátricos prévios, apesar de em 50% dos casos a depressão pós-parto, ser o primeiro episódio depressivo. Estudos prospetivos e retrospetivos revelam que uma história de depressão prévia aumenta a incidência de depressão pós-parto em 10% a 24% (Hearn et al., 1998). No caso da depressão ocorrer na gravidez, o risco de recidiva
no pós-parto é de 35% e se existirem antecedentes de depressão pós-parto o risco de recidiva é de cerca de 50% (Wisnr & Wheeler, 1994).

O pós-parto representa, pois, um momento marcante para a mulher, pelo que é um período que acarreta grandes transformações, não apenas no organismo, mas também na dimensão psicossocial e familiar. Historicamente, há muito que o puerpério é reconhecido como um momento crítico e de alto risco do ponto de vista emocional.

Todas as alterações multidimensionais que ocorrem na grávida podem explicar a etiologia da psicopatologia no ciclo gravídico, bem como o aumento de condições negativas para o desenvolvimento de distúrbios psicopatológicos no puerpério.

* Benedita Aguiar é Psicóloga Clínica e Especialista Avançada em Sexualidade, reconhecida pela Ordem dos Psicólogos Portugueses.

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